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O Fígado

O fígado é um órgão de suprema importância, o coração do sistema digestivo, o órgão mais pesado do organismo (1,5kg), sem o qual não sobrevivemos e para o qual não existe substituição. As doenças do fígado, com destaque para o cancro e para as hepatites, causam anual e mundialmente a morte de cerca de 2 milhões de pessoas.

É a 4ª fatalidade por cancro no mundo e a 8ª em Portugal por doenças do
fígado. Pelo que é fundamental seguir os três mandamentos que garantem a saúde do fígado: reduzir a ingestão de tóxicos – o álcool tem um impacto tremendo; evitar comportamentos de risco que abram a porta às hepatites; e ter uma dieta saudável, com exercício físico.

Conhecer o Fígado

O fígado é o órgão mais pesado do corpo humano. Pesa em média 1,5 kg (600 a 1,860 gr). A cada minuto, passa pelo fígado 1 a 2 litros de sangue, representando 20% do consumo total de oxigénio do corpo humano. Sem ele nenhum ser humano sobrevive, e ainda não existem mecanismos de substituição seguros e eficazes, ao contrário do rim, coração ou pulmão.

São múltiplas as funções que o fígado desempenha:

1) síntese de proteínas entre enzimas e hormonas, fatores de coagulação, fatores de crescimento essenciais ao funcionamento de todo o organismo humano;

2) controlo dos níveis de glicose no sangue;

3) metabolização e excreção da bilirrubina, um derivado da hemoglobina proveniente dos glóbulos vermelhos em senescência;

4) metabolização e excreção de múltiplos compostos orgânicos endógenos (hormonas, proteínas, vitaminas) e exógenos (drogas/tóxicos, medicamentos).

O fígado funciona, em boa verdade, como órgão centralizador da função digestiva, ao produzir e excretar a bílis (composto essencial à digestão e posterior absorção de gorduras e vitaminas lipossolúveis) e ao metabolizar e armazenar parte dos nutrientes provenientes da absorção intestinal.

O Fígado em Portugal e no Mundo

A cada ano, as doenças de fígado são responsáveis pela morte, muitas vezes precoce, de cerca de 2 milhões de pessoas em todo mundo. São cerca de 3,5% de todas as mortes. No continente Europeu estima-se que 23% da população tenha algum grau de fígado gordo não alcoólico (esteatose, doença hepática associada à obesidade, diabetes e hipertensão). O impacto do álcool é tremendo com cerca de 108 mil mortes anualmente por doença hepática alcoólica (41% de todas as mortes atribuíveis a doença hepática neste continente). Em relação às hepatites virais, estima-se que 0,5 a 0,7% da população europeia tenha hepatite B crónica e 0,13 a 3,26% hepatite C crónica. Representam respetivamente 18 e 24% das causas de morte por doença hepática. Estima-se que em Portugal ainda existam cerca de 40.000 pessoas infetadas a necessitar de tratamento. Contudo, o impacto das hepatites virais será reduzido no futuro pela introdução das novas terapêuticas antivirais de ação direta que permitem a cura da hepatite C e o bom controlo da hepatite B. Nas próximas décadas, o álcool e a obesidade vão ser os dois atores principais deste drama.

Os dados para Portugal são mais escassos, mas parecem acompanhar a situação na Europa e no Mundo. As doenças hepatobiliares são a 8ª causa de morte em Portugal. Nas últimas décadas, a hospitalização por doença hepática avançada é dominada pela doença hepática alcoólica (81%), hepatite C (8%) e B (2,9%). A prevalência de fígado gordo não alcoólico em Portugal ronda os 17-25%, sendo que 37% da população portuguesa apresenta algum grau de esteatose hepática.

Por fim, uma das formas de morte por doença hepática é o cancro primário do fígado (carcinoma hepatocelular ou hepatoma), muito associado às etiologias já descritas. Mundialmente, representa a 4ª causa de morte por cancro com cerca de 781 mil mortes por ano. Em Portugal é a 7ª causa de morte por cancro (1372 mortes/ano) e a 3ª causa de morte no grupo de doenças hepatobiliares.

A Saúde Digestiva do Fígado

Os três mandamentos para garantir a saúde do fígado:

1) uma dieta saudável, limitando o consumo gorduras e hidratos de carbono simples, em especial os açúcares. Privilegiar o consumo de legumes e vegetais, e alguns hidratos de carbono complexos em moderada quantidade. Complementar com exercício físico, pois diminui a resistência à insulina e melhora o risco de fibrose em múltiplas doenças hepáticas. O ideal será três caminhadas por semana, em passo rápido, de 20-30 minutos.

2) abolir ou no mínimo limitar o consumo de bebidas alcoólicas a 2 unidades (sensivelmente 10gr por cada unidade) de álcool por dia é essencial (não vale acumular e gastar tudo numa “noitada”). O consumo de medicamentos deve ser limitado ao necessário e prescrito por um médico, e o consumo de “produtos naturais”, vitaminas e outros “suplementos” devem ser abolidos sob risco de poder causar hepatite ou mesmo falência do fígado (“hepatite fulminante” com necessidade de recorrer a transplante hepático de emergência). A suplementação de nutrientes e vitaminas só tem lugar em casos muito específicos, com diagnóstico preciso, e não é indicado na população geral, nem mesmo nos atletas. E o café? Beber 2-3 cafés por dia evita o cancro do fígado, mas sem açúcar.

3) abster-se de comportamentos de risco, nomeadamente o consumo de drogas injetáveis ou outras, e comportamentos sexuais de risco, reduz significativamente o risco de desenvolver hepatite viral crónica (B ou C).

Prevenir, Diagnosticar e Tratar

A tónica tem de ser na prevenção, pois o que causa doença ao fígado depende geralmente de nós, e uma vez o mal causado, a saúde do fígado não pode ser “recuperada”. O diagnóstico atempado e eficaz de fatores de risco, de alterações físicas/laboratoriais e do estádio de evolução, pode permitir “estabilizar” a doença. Quanto ao tratamento, nos últimos anos temos assistido a avanços notáveis nas terapêuticas para a doença hepática: a cura da hepatite C com novos antivirais; fármacos para as doenças colestáticas; novas e empolgantes moléculas em investigação para o fígado gordo não alcoólico; o tratamento do carcinoma hepatocelular; as técnicas de transplante para casos selecionados. Estamos a evoluir.

Em quase 100% dos casos de tratamento da hepatite C consegue-se eliminar o vírus de forma definitiva e evitar a evolução para cirrose ou cancro do fígado.

Uma curiosidade sobre o Fígado

Para várias civilizações antigas, dos Babilónios aos Gregos e Romanos, o fígado foi peça central dos rituais religiosos, como elemento preditor do futuro. Cerca de 200 anos d.C., Galeno definiu o fígado (e não o coração, como a gíria popular mais tarde generalizou) como órgão central o corpo humano, centro da alma e sede dos “humores”.