A diarreia define-se como 3 ou mais dejeções moles/dia com mais de 4 semanas de evolução. É uma condição frequente com uma prevalência de aproximadamente 5% na população adulta, mais frequente no sexo feminino e em idade mais avançada. O consumo de recursos de saúde relacionados com a diarreia crónica é difícil de aferir e balizar.
Alguns aspetos práticos a reter em relação à diarreia crónica:
– É muito importante a história clínica e exame físico na avaliação de um doente com diarreia crónica. Por exemplo, por detrás de uma aparente história de diarreia, pode-se encontrar uma situação de incontinência fecal que deve ser identificada.
– A nossa alimentação e medicação podem ser causas frequentes de diarreia. O consumo alcoólico, o consumo de lacticínios, de café ou de produtos fermentáveis pode contribuir para um quadro de diarreia. Diarreia como efeito secundário de medicamentos deve também vir no topo da lista de possíveis causas de diarreia crónica e é facilmente identificável e corrigível. São exemplos os protetores gástricos, anti-inflamatórios, antidiabéticos orais e alguns diuréticos e antibióticos.
– Os distúrbios do eixo cérebro-intestino, frequentemente denominadas “doenças funcionais” são causa comum de diarreia crónica. Podem causar quadros de diarreia crónica com alteração de flora intestinal e/ou motilidade e sensibilidade digestivas.
– Só chamar a atenção que causas menos comuns são mesmo menos comuns. Diversos outros mecanismos podem provocar diarreia crónica como as alterações anatómicas e/ou fisiológicas após cirurgia digestiva, as neoplasias do sistema digestivo, as doenças intestinais inflamatórias, as doenças de má absorção, as doenças pancreáticas.
– É importante categorizar o tipo de diarreia para um estudo complementar mais dirigido, atendendo a este largo espectro de causas e mecanismos (medicamentosa, alimentar, funcional pós-cirúrgica, pós-infeciosa, inflamatória, mal absortiva).
– É impraticável generalizar um protocolo de estudo da diarreia crónica como se percebe pelo espectro alargado de condições que podem despoletar a diarreia crónica e pelos inúmeros possíveis testes de diagnóstico, alguns cuja performance não é ideal, alguns caros e inacessíveis. Assim, a investigação mais ou menos extensa da diarreia pode revelar-se um equilíbrio delicado e poderá incluir análises sanguíneas e de fezes, exames endoscópicos e imagiológicos diversos, testes respiratórios.
– O tratamento da diarreia crónica dependerá da causa da diarreia. Poderá passar pela exclusão de certos fármacos, controlo metabólico adequado, conselhos dietéticos orientados por nutricionista. Medicação dirigida e opções cirúrgicas podem ser consideradas em determinadas doenças que provocam diarreia crónica.
Drª Ana Célia Santos,
Presidente do Núcleo de Neurogastrenterologia e Motilidade Digestiva, da SPG